segunda-feira, dezembro 12, 2005

Um pouco Octavius.

Há dias sinto uma enorme vontade de escrever. Estou viciado.
Fiquei pensando sobre o que escrever, não que falte acontecimento,vida ou até mesmo personagens, mas poucos detalhes gostaria de mencionar. Nada demais, mas são os arabescos íntimos que tornam os acontecimentos interessantes. Ainda tenho pudores aqui. Talvez um dia passe.
Estou vivendo a tempestade de dezembro - chovem:
_ projetos para serem avaliados, diários para serem preenchidos, recuperações, reprovações, reuniões infindas, gente chata [não sei se é chatice concentrada ao longo do ano ou minha paciência que finda em dezembro] festinhas de despedida, aniversários[a melhor parte da tempestade que nem sempre aproveito], projetos inacabados, uma lista de pessoas e presentes que ainda não encontrei, shopping lotado. Só enxergam pacotes e eu só quero o meu quarto.
Semana passada tive a sensação de ter vivido uma segunda-feira gigante. Todos os dias foram segunda-feira. Dormi muito pouco. Perdi a noção dos dias. Perdi objetos. Esqueci nomes. Esqueci de mim. No meio de tudo ganhei um revellion em pleno dezembro, surpresa de alunos e da Cris.
O calor senegalês deu uma pausa. Chove e isso ameniza o meu desgaste.
A vontade é de ficar lendo na cama, de cinema, de reunir os amigos pra jantar, de tomar um Earl Grey Tea, bolo de laranja, biscoito de amendoim, panettone.
Joana sabe xingar oralmente as pessoas chatas, quase só ela ouve.
Enquanto suporto, xingo internamente. Um dia ainda viro uma bomba verbal.
Dane sempre me surpreende, hoje ela chegou com meu presente de natal antecipado:
- Octavius.
Octavius é um polvo verde, seis tentáculos, boca pequena, olhos gigantes, amendoados e pedintes. Octavius pede colo, pede cama, pede o outro que ainda não conheceu. No fundo Octavius sabe que vai dar conta. Ele também viveu dias de tempestade, disputando com outros animais um olhar sensível que o resgatasse daquela vitrine. Eu só queria o resgate do tumulto. Eu não tenho os seis tentáculos de Octavius, mas sei que vou suportar.

p.s.1: _ Dane, eu te amo.
p.s.2: _ Octavius vai namorar Gomes, um leitão rosado de olhos gigantes,amendoados e pedintes da Mari.

segunda-feira, novembro 28, 2005

Eu posso mostrar a língua

Quarta-feira quando cheguei em casa - na verdade já era madrugada de quinta - tinha um recado engraçado na secretária eletrônica. Um convite para um almoço no sábado. Frango assado e farofa na cobertura de uma amiga que durante alguns anos dividimos intensamente a vida. O pensamento pedia as lembranças e fui dormir recordando.
Quinta-feira liguei para confirmar o convite. Ficamos meia hora rindo ao telefone, quase sempre foi assim.
À noite fui a dois shoppings - aniversários amáveis, casamentos encontros, e o natal... Prefiro me antecipar. Na companhia de Norma Lúcia debochei de tudo, inclusive de nós mesmos, era inevitável... As pessoas ainda se espantam, talvez seja por causa dos nossos óculos, talvez por causa do colar pink de contas gigantes de Norminha... nada que uma boa língua pra fora seguida de uma gargalhada não resolva. Às vezes é preciso desconcertar olhares estranhos, ficam sem saber onde afundar a opinião. Como disse a sobrinha da Cris: - Cada um na sua, vovó... mas os freqüentadores TFP [tradição, família e propriedade] de shopping center têm dificuldade.
Depois de uma visão estranha [tempos atrás seria familiar, mas é estranha, pois é vazia de sentimentos e se é vazia, não existe, casca vazia de cigarra, já foi] através de uma vitrine entendi o recado do senhor do destino: era só para lembrar que sou mais vivo, intenso, livre, melhor do que jamais fui. Deixei o estranhamento para trás, Norminha me abraçou e saí cantando internamente: I´m free to do what I want...
Comemoração - sorvemos densos milk shakes de Ovomaltine e entre uma sugada e outra ataques de riso. Doce para amenizar a acidez crítica.
Final da noite na Savassi. Novamente os jogos dos quais já não estou disposto. É verdade que gosto do espanto da sedução. Porém o período é sabático, fiquei monossilábico, aliás, não quero falar de mim, eu que mal sei o seu nome e nem quero saber de gente ficção. Qual é a sua realidade?
Eu não quero raquetes imaginárias, meu jogo é real.
O almoço de sábado chegou. Almoço aconchegante.Chovia torrencialmente. Atrasos e a confusão de sempre.
Cerveja gelada, o pensamento ansiosamente virando palavras que fugiam atropelando umas as outras, no caos o entendimento.
A sensação é de que o tempo passou muito rápido. Algumas coisas se apagaram. Minha amiga tem dois filhos lindos. A vida seguiu rumos diferentes, mas a cumplicidade e fidelidade apesar de tudo permanecem.
Agora a sensação é de contentamento... qualquer coisa eu mostro a língua.

quarta-feira, novembro 23, 2005

Enceradeira na existência

Hoje acordei antes do despertador, bem antes. Ando lutando contra a escassez.
Já estou vivendo o tumulto do final de ano.
Estou enjoado. Eu enjôo fácil. Enjôo existencial não tem Plasil que cure.
Vontade de virar urso e hibernar. É fuga eu sei, mas é um esconderijo seguro.
Quando enjôo preciso ficar sozinho. Eu, a gata, as flores, as músicas, os livros, a cama.
Eu preciso de certos requintes.
Tento ter cuidado para não virar porco espinho, às vezes escapa. Eu não sei fingir. Os amigos já sabem. Período sabático.
Cortei o cabelo. Sempre alivia. Norma Lúcia também cortou e tivemos breves surtos de felicidade instantânea. A alegria de Norma Lúcia passou. A minha com o cabelo permanece, mas me perco no tumulto.
A notícia me perturbou.
Um passarinho foi morto com um tiro de rifle na Holanda. Ele derrubou vinte e três mil peças de dominó entre não sei quantas milhões de peças montadas para serem derrubadas ordenadamente na tentativa de se bater um recorde. Fiquei imaginando a brutalidade. Amsterdã é um lugar interessante, bacana. No inverno parece um desenho do Snoopy com todos aqueles canais congelados e crianças patinando no gelo ouvindo música clássica.
As pessoas precisam estar munidas de rifles para montarem dominó em um estádio?
Não poderiam simplesmente espantar o passarinho e remontar o estrago? Eu não acho que passarinhos sejam apenas animais, pra mim se enquadram em uma categoria mais divina, encantada. Era só um passarinho distraído, poderia ser eu ou qualquer um.
Às terças feiras as marcas do meu assoalho desaparecem à medida que a enceradeira desliza sobre ele. De longe só se enxerga o brilho. De perto os arranhões mais profundos podem ser vistos.
Eu queria uma enceradeira na existência.

terça-feira, novembro 15, 2005

Feriado em família

Domingo eles chegaram.
A última vez que nos vimos foi no dia dos pais. Eu sempre aproveito o cansaço e vou empurrando os encontros, mas isso sempre me causa incômodo. Um incômodo onde se situam minhas raízes.
O apartamento fica mais vivo. Sentimentos, lembranças, aromas, delícias, graça, palavras por todos os cantos, cumplicidade.
Um passeio que poderia ser muito bobo e é, mas foi para sempre. A torre do Alta Vila. Assim como quando fomos ao cinema assistir Central do Brasil. Instantes em que me sinto privilegiado e que o mundo poderia explodir no minuto seguinte.
Há 14 anos não moramos mais juntos, desde então tento fazer com que cada reencontro seja único.
Uma certa insanidade nos rege, nos une e a mim particularmente, fortalece. Às vezes passo horas a lembrar da minha infância. Pensando em tudo o que fizeram e deixaram de fazer por mim. E não foi pouco... sou o filho caçula. Sim, eu fui e ainda sou mimado, mas não se preocupe, não sou estragado.
Assistimos ao dvd: Os Aspones. Minha mãe achou bobo, mas riu, meu pai mais moderno, gostou. Meu irmão se alternava entre risos e cochilos. Eu gosto muito.
Fomos a diversos lugares. Da Far East ao Mercado Central.
Eu não trocaria estes dias por nada.
E porque sei que um dia tudo isso vai acabar, abre-se um abismo no meio do meu peito. O tempo não dá uma trégua.
Hoje a tarde voltaram para o endereço que repeti exaustivamente durante muito tempo da minha vida, o endereço para onde sempre volto e me acho.
Amanhã tudo volta ao seu lugar, por hora talvez Adélia Prado me conforte.

p.s.:Fernanda, obrigado por tanto carinho e pela homenagem, um luxo.

segunda-feira, novembro 07, 2005

Personagens de um domingo cinzento

Adoro acordar e ver o dia cinzento.
Acho engraçado quando o homem [ou a mulher] do tempo diz na tv a previsão: - ... tempo ruim. Tempo ruim para que ou para quem? Para mim poderia ser anunciado assim:
_ um dia nublado e chuvoso, aproveite! Ontem foi assim.
Café quente, bolo de laranja, pão de queijo. Café da manhã aos domingos é quase um ritual e rituais me humanizam.
Na seqüência um filme. O que revelou Audrey Tautou - Instituto de Beleza Vênus. Um filme de 1998, mas que só agora consegui assistir. Leve, divertido, sensível. Vencedor de 4 prêmios César.
... O amor é só mais uma das muitas formas de se perder a liberdade... é o discurso da personagem central, às vezes concordo, mas com o tempo acabo me rendendo. Eu sei inventar regras, mas também sei ignora-las.
Banho quente. Almoço em ótima companhia. E depois um divertido desfile. Vejo sempre as mesmas pessoas e as novas que surgem. A vida é um acúmulo de gentes personagens. Algumas entram, outras nunca fizeram parte. Figurantes do meu filme real, mas sempre ali [cada um com a sua máscara, alguns se perdem em seus papéis, já não sabem ao certo quem são]. Há também pessoas recentes, aquelas que eu mal consigo lembrar os nomes. Às vezes esqueço nomes do passado, é necessário. Tenho interesse em guardar alguns, levar para futuros dias cinzentos.
Não consegui ver tudo. Era preciso mais uns dois pares de olhos, só com um par estava difícil. Muita informação.
As pessoas me confundem. São muitos os jogos e alguns já não estou disposto.
A tarde [em um café] passou regada a Heineken, imitações de beetlejuice, gargalhadas, família fofs, invenções de pactos dominicais, beijos performáticos e os olhos brincando de escravos de Jó. Esqueci os dentes de beetlejuice e me concentrei nos olhos, enormes e pretos. Mais tarde meus amigos prepararam um delicioso jantar [não era mingau nem sopa] e no meio do jantar, nossa amiga Norma Lúcia fez um topless, dançou liberta de sutiã e pudores. A personagem mais autêntica, insana e divertida deste domingo.
Hoje o dia amanheceu cinzento e na minha cabeça o olhar intenso e inesquecível de beetlejuice...

p.s. : obrigado a Isabela e Fernando pela ajuda indispensável neste blog e a todas as visitas e comentários.

segunda-feira, outubro 31, 2005

Espelho, espelho meu...

Para quem não acreditava que eu ainda faria um blog, agora não é mais uma lenda...
depois de alguns meses decidindo se deveria ou não, e ainda, sem chegar a nenhuma conclusão, hoje apenas aconteceu.
Não possuo uma identidade relevante. Não sei se é vaidade. Não sei se é a morte de um hiato.
Não sei se estou adolescendo [uma coisa é idade cronológica, outra bem distinta é idade real] ou adultescendo.
Não sei se é vontade de pertencer, de inventar, de entender, de registrar, de aparecer ou simplesmente de expressar os devaneios que giram dentro da minha cabeça; eu não sei.
Todos têm uma certa culpa nesta minha escolha. Os que criticaram, incitaram -me. Os amigos apoiaram ou intimidaram-se diante da minha determinação. As professoras de literatura e redação têm culpa, foram muitas e não me esqueço delas. Os meus autores têm culpa. As palavras têm culpa, me perseguem, se juntam, viram frases.
Se as palavras não existissem, o pensamento teria forma?
Serão apenas alguns fragmentos, dias Mingau e dias Sopa.
Os dias mingau são sempre mais densos, consistentes. Os sopa, mais ralos, às vezes aguados. Um não é melhor que o outro. Mingaus e sopas podem ser doces, salgados, amargos, ácidos, crocantes, perfumados, coloridos, insossos, inodoros, claros, escuros, assim como os dias.
Talvez seja apenas mais uma tentativa desesperada de transcender, revolucionar o meu simples dia a dia.
Então, que assim seja: - espelho, espelho meu...